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A revolta do Vinagre

A recente onda de protestos que atingiu nos últimos dias várias capitais brasileiras contra o reajuste das tarifas de ônibus, e que atingiu proporções de um enorme protesto nacional para expressar a indignação popular contra várias situações pontuais (gastos excessivos na construção de estádios) e outras já cronificadas como a situação da Saúde e Educação, já foi batizada de  A Revolta do Vinagre em referência a lenços e bandanas embebidas em vinagre que os manifestantes usavam para, supostamente, se proteger da exposição ao gás pimenta ou ao gás lacrimogêneo utilizados, por parte da policia, como arma de controle de multidões.

Mito ou verdade?

  • Gás pimenta

O gás pimenta é fabricado com duas substâncias irritantes que ocorrem no Capsicum (pimenta), a capsaicina e a dihidrocapsaicina.  No ambiente ocupacional, os trabalhadores que manuseiam Capsicum annum (pimenta caiena) e Capsicum frutescens (pimenta chili) têm maior incidência de tosse. A capsaicína encontrada em espécies de Capsicum (C. annuum, pimenta-doce, e C. frutescens, pimenta-malagueta, Solanaceae) produz sensação de queimação nas terminações sensoriais. Estes compostos são empregados com a finalidade de incapacitar algum animal ou humanos. No Brasil sua comercialização é proibida sendo apenas permitida sua utilização pelas Polícias. Nos países onde seu comércio é permitido, o spray de pimenta é muito utilizado em trilhas de caminhadas com vistas à proteção contra ataque de animais como cães, lobos e ursos.

Os compostos comercializados para esse fim podem ocorrer em dois tipos, o gás OC (Oleorresina capsicum) que produz uma névoa fina e facilmente inalada, principalmente em espaços confinados, ou quando a pessoa está respirando com dificuldade devido a esforço ou em situações de medo e o  aerossol de pimenta, cujo emprego consiste na forma de spray, e é menos propenso de promover exposição por inalação. Sua utilização como arma de controle se dá por sua ação incapacitante devido aos sintomas que promove. Trata-se de um agente inflamatório que provoca efeito nos olhos, nariz e boca e possui efeito mais limitado sendo necessária a utilização direta na pessoa (animal)-alvo.

Por ser potente irritante o spray de pimenta causa dor imediata e fechamento dos olhos devido ao inchaço das pálpebras. Quando inalado, provoca inchaço no interior do nariz, boca e outras membranas mucosas. Quando esguichado nos olhos ou aspergido em altas concentrações torna a respiração difícil e é altamente incapacitante.

  • Gás lacrimogêneo

Gás lacrimogêneo é um termo genérico dado para vários tipos de substâncias que provocam irritação da pele, olhos e vias respiratórias. Estes compostos não são considerados como agentes químicos de guerra, mas empregados para alegados fins de segurança pública, para conter tumultos internos. São compostos orgânicos pertencente à classe dos Haletos, compostos que apresentam pelo menos um átomo do grupo dos Halogênios (F, Cl, Br, I) ligado a um grupo derivado de hidrocarboneto. São potentes irritantes que quando alcançam as vias respiratórias, atingem o pulmão, gerando efeitos internos que potencializam os externos. São capazes de provocar irritação nos olhos e cegueira temporal, além, é claro, de lacrimejamento. Outros efeitos comuns são: falta de ar, aumento de secreção, tosse, vermelhidão e coceiras na pele. Os sintomas levam entre 20 e 45 minutos para se encerrarem totalmente. O gás não é letal em pequenas doses, mas, em situação de confinamento, pode ser fatal.

Esses gases foram desenvolvidos para apresentarem alta margem de segurança, porém, podem provocar ferimentos e até a morte quando empregados em espaços sem ventilação adequada e por períodos prolongados.

            Tais agentes foram empregados ao longo da história. O etilbromoacetato foi empregado pela primeira vez em agosto de 1914 na França, o xilil brometo foi empregado primeiramente em janeiro de 1915 na Alemanha, o cloroacetofenona foi empregado pós 1ª guerra nos EUA, e diversos outros foram empregados desde a 1ª Guerra Mundial, porém, devido à alta toxicidade, foram banidos.

Os principais gases  comercializados atualmente para essa finalidade são: 1-cloroacetofenona (CN) e O-clorobenzilideno malononitrila (CS).

Os efeitos do CN sobre a pele, olhos e sistema respiratório incluem: eritema cutâneo, pode ocorrer o desenvolvimento de bolhas e queimaduras em tecidos devido à formação de HCl, lacrimejamento forte com conjuntivite, dor nos olhos, contração involuntária das pálpebras e em elevadas concentrações pode produzir queimadura química nos olhos; irritação das vias respiratórias, tosse, dispnéia, pode ocorrer queimadura nos tecidos respiratórios e até lesões pulmonares.

Já os efeitos do CS incluem: irritação da pele, ardor e eritema, pode ocorrer dermatite de contato e até bolhas, provoca queimação e irritação nos olhos com lacrimejamento e movimento involuntário das pálpebras; secreção, tosse, engasgo, aperto no peito, pode causar a síndrome de doença das vias respiratórias.

Em ambientes arejados, quem pode sofrer com o gás são pessoas que possuem pré-disposição a problemas pulmonares (asma e bronquite). O gás pode desencadear uma pneumonite química, embora os casos sejam raros. No corpo, o produto age por uma diminuição na quantidade de oxigênio disponível devido a um bronco espasmo. Na tentativa de eliminação, há uma redução na quantidade de ar que entra. Por isso, quando há uma doença de base, pode haver uma exacerbação das consequências.

  • Vinagre

Durante as manifestações diversas pessoas utilizaram lenços embebidos com vinagre como forma de mitigação dos sintomas produzidos pelos gases. Neste cenário, o vinagre se tornou um dos principais personagens. O tradicional tempero de saladas, que tem odor muito forte, chegou até a causar prisões.

 Aprofundando-se na análise da composição do vinagre comercial, que possui entre 4 e 8% de ácido acético e é oficialmente conhecido como ácido etanóico, não se encontrou nenhum dado que confirmasse que o uso do produto seria um antídoto eficaz, ou mesmo que aliviasse os sintomas provocados pelo uso do gás. Não há uma explicação química, exceto para o gás brometo de benzila que reage com o ácido acético, constituinte do vinagre – o bromo reage com o H+ do ácido acético, e forma o benzoato de etila que não é um agente irritante.

Há consenso geral entre as pessoas expostas aos gases anti-motim que o uso de algum pano embebido com vinagre ou suco de limão proporcionaria melhor proteção do que o pano embebido em água e que se pode  respirar através dele, relativamente bem, durante vários minutos. Segundo alguns relatos, o vinagre é útil para tratar ardências na pele causadas pela capsaicína. Entretanto, se o agente empregado for o gás CS, a melhor proteção para minimização dos efeitos seria o emprego de uma solução salina (água + bissulfeto de sódio a 5%). Durante a 1ª Guerra Mundial os soldados improvisavam máscaras com panos embebidos em urina.

Embora, em bases teóricas não haja embasamento para o fato de o vinagre proporcionar qualquer proteção ou alívio dos sintomas após a exposição a esses agentes incapacitantes, o fato de várias pessoas reportarem a melhora, carece de explicação. De acordo com Paul Dessauer (comunicação pessoal) poderia ser o fato de que, por ser o vinagre também um irritante (menos potente, mas irritante) serviria para promover lacrimejamento e secreção que funcionariam como uma barreira temporária (pela umidificação das mucosas) no nariz e nos olhos contra os irritantes mais potentes.

Com certeza, sabe-se que o ideal para evitar os efeitos provocados pelo gás lacrimogêneo seria a utilização de máscaras de proteção respiratória com carvão ativado, única maneira de se reter gases e líquidos. E o mais indicado em caso de exposição aos gases lacrimogêneos é a lavagem dos olhos com soro fisiológico ou água corrente para minimizar a ardência, a pele exposta deve ser lavado com água e sabão. Nos casos em que o indivíduo apresente dificuldades de respiração deve-se buscar procurar atendimento médico.

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